Como escrever uma carta de motivação que não seja um cliché

A maioria das cartas de motivação não é lida. E quando é, raramente surpreende. Porque quase todas dizem o mesmo:

“Desde cedo desenvolvi um grande interesse pela vossa área…”

“Sou um profissional dinâmico, resiliente e com vontade de aprender…”

“Acredito que posso ser uma mais-valia para a vossa equipa…”

Nada disto é mentira. Mas não diz nada de novo. Nem mostra quem está por detrás do documento.

Se quer escrever uma carta de motivação que não caia no cliché, o caminho é outro: clareza, contexto, contributo. Escrever como quem sabe quem é — e por que está ali.

Sem bajulação. Sem fórmulas recicladas. Com verdade.

1. Comece pelo “porquê esta empresa”, não “quem sou eu”

O erro mais comum é começar pela apresentação pessoal. Mas as primeiras linhas devem ser sobre o lugar a que se candidata.

O que admira na empresa? Que valores partilha com ela? Que projectos segue com interesse? Que desafios lhe chamaram a atenção?

Exemplo de abertura forte:

Acompanho o vosso trabalho desde o lançamento do programa de sustentabilidade interna em 2022 e identifiquei-me com a abordagem transversal à cultura organizacional. Esta forma de pensar o impacto é uma das razões que me leva a candidatar-me à vossa equipa.

Aqui, mostra conhecimento. Escolheu estar ali. Não está a mandar CVs em série.

2. Depois, ligue a sua experiência a esse contexto

Agora sim: fale de si. Mas não faça uma biografia. Escolha 2 ou 3 pontos do seu percurso que façam ponte com o que esta função precisa. E explique porquê fazem sentido aqui.

Use a estrutura:

– O que fez

– O que aprendeu

– Como isso pode contribuir

Exemplo:

Nos últimos 4 anos, trabalhei na área de gestão de talento em ambientes de rápido crescimento. Essa experiência ensinou-me a implementar processos de onboarding e feedback contínuo com impacto real na retenção. Acredito que esse conhecimento pode apoiar o vosso actual processo de expansão e integração de novas equipas.

Foco: valor acrescentado. Sem adornos.

3. Evite adjectivos vagos — use verbos, acções e resultados

Palavras como “proactivo”, “colaborador”, “resiliente” ou “perfeccionista” perderam força. Toda a gente as usa — e poucos as demonstram.

Prefira mostrar em vez de dizer.

Não diga “sou focado”. Diga “entreguei X projecto com Y impacto em Z semanas”.

Transforme qualidades em provas.

4. Termine com disponibilidade e alinhamento — não com submissão

Frases como “aguardo ansiosamente uma oportunidade para provar o meu valor” ou “fico a aguardar uma resposta vossa” soam submissas.

Prefira terminar com solidez:

Estou disponível para uma eventual entrevista onde possamos explorar como posso contribuir para os vossos objectivos actuais.

Agradeço desde já a atenção à minha candidatura e coloco-me inteiramente à disposição para partilhar mais detalhes sobre a minha experiência.

Mostra profissionalismo, não desespero.

5. Formato: simples, limpo, legível

– Use um documento separado em PDF

– Máximo uma página A4

– Parágrafos curtos, com espaço entre eles

– Evite linguagem excessivamente formal ou arcaica

Linguagem recomendada: profissional, mas próxima. Sem floreados. Com sujeito, verbo, predicado. Sem tentar impressionar com palavras que não usaria numa reunião.

6. Personalize. Sempre.

Se está a copiar/colar a mesma carta para várias empresas, vai perder eficácia.

Adapte para cada vaga:

– Mude o nome da empresa (óbvio, mas muitas vezes ignorado)

– Ajuste o foco consoante os requisitos

– Referencie algo específico (um projecto, uma iniciativa, uma notícia recente)

Uma carta personalizada distingue-se imediatamente.

7. Leia em voz alta antes de enviar

É o melhor teste. Soa natural? Tem fluidez? Parece uma pessoa a falar, ou um robot a justificar-se?

Se não conseguir dizer a carta em voz alta sem tropeçar — reescreva.


Escrever uma carta de motivação não é um exercício de bajulação. É uma proposta. Um convite. Uma declaração de intenção.

E deve ser escrita com consciência, não com medo.

A melhor carta não é a que impressiona.

É a que revela.

Quem escreve com clareza sobre o que tem para oferecer — e por que escolheu aquele lugar — já se está a destacar.

Sem clichés. Sem fórmulas. Com verdade.

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