Entrevistas são conversas, não interrogatórios. E sim, de ambos os lados.

Durante demasiado tempo, o processo de recrutamento foi tratado como uma via de sentido único: a empresa pergunta, o candidato responde.

Mas esse modelo está a morrer — e ainda bem.

Porque as entrevistas não são testes de submissão. São conversas entre adultos, com poder de decisão dos dois lados da mesa.

E candidatar-se a um emprego não significa abdicar da própria voz.

Quantas vezes um candidato foi confrontado com perguntas como:

“Pode explicar esta lacuna de dois meses no seu currículo?”

E se a resposta fosse:

“Pode explicar porque é que esta vaga está em aberto há dois meses?”

Ou:

“Quais são as suas maiores fraquezas?”

Ao que o candidato poderia, com justeza, responder:

“Quais são os principais pontos cegos da empresa neste momento?”

Não se trata de inverter papéis.

Trata-se de equilibrar expectativas.

De lembrar que o candidato também está a avaliar a empresa. E tem esse direito.

A entrevista como espaço de espelho

Perguntar “porque é que saiu do último emprego?” é legítimo.

Mas então, por que razão não se pergunta também:

“Porque é que a pessoa anterior deixou esta função?”

Se há transparência, deve haver para os dois lados.

Se há curiosidade, que seja mútua.

Se queremos avaliar fit, cultura e potencial — então vamos abrir a conversa, não limitar a narrativa.

Perguntas que revelam mais do que o currículo

“Fale-me de uma situação onde falhou.”

Claro. Mas e se o candidato perguntar:

“Fale-me de uma vez em que a equipa falhou. O que aconteceu depois? O que mudou?”

Ou ainda:

“Onde se vê daqui a cinco anos?”

Ao que pode (e deve) corresponder:

“Para onde esta equipa está a caminhar nos próximos cinco anos?”

Estas perguntas não são insolência.

São sinais de um candidato consciente, informado, que quer fazer parte — e não apenas ocupar um lugar.

Falar de salário sem rodeios

Ainda é tabu perguntar:

“Que salário pretende?”

Mas ninguém quer falar sobre o orçamento definido para a função.

Ora, perguntar:

“Qual é o intervalo salarial previsto para esta posição?”

não é desrespeito. É inteligência profissional.

É saber gerir expectativas e tempo — de ambos os lados.

Pressão, conflito e pertença

“Lida bem com pressão?”

A pergunta inversa é poderosa:

“Que tipo de pressão é comum nesta função, e como é gerida pela liderança?”

Ou:

“Como lida com conflito?”

responde-se com:

“Como é que a liderança lida com conflito ou dissensão interna?”

Estas perguntas não são armadilhas.

São ferramentas de leitura.

E ajudam a perceber não apenas o papel, mas a estrutura, a cultura e o ambiente em que se vai trabalhar.

Porque é que quer trabalhar aqui?

A pergunta clássica.

Mas talvez o mais honesto seja devolver:

“Porque é que quem já cá está escolhe continuar?”

Porque o que queremos saber não é o slogan. É a vivência real.

Conclusão: entrevistas são convites à verdade

Nem todas as empresas estão preparadas para este tipo de diálogo.

Nem todos os candidatos se sentem seguros para fazer estas perguntas.

Mas quem está de um lado — ou do outro — deve saber:

A entrevista não é um interrogatório.

É um encontro.

E como em qualquer encontro, o respeito é mútuo.

Entrevistas vão nos dois sentidos.

Faz melhores perguntas.

Lê nas entrelinhas.

E lembra-te:

tu também estás a entrevistá-los.

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